O Fundo Soberano aumentou investimentos em Angola e em países vizinhos face ao potencial de retorno e aplica 25% do capital em obrigações nas grandes praças financeiras devido a liquidez. O chairman do FSDEA falou em exclusivo ao Mercado.
O que favorece na relação com parceiros de negócios a adopção das normas internacionais IFRS no relatório e contas do Fundo Soberano?
Para os nossos stakeholders, a conversão para as normas internacionais facilita o entendimento de como é que o Fundo está do ponto de vista de investimento.Este ano, o relatório e contas da instituição vai ter notas mais extensas que descrevem cada um dos investimentos que foram feitos, para cada um dos activos haverá uma previsão em termos de rentabilidade e avaliação de risco, que foi feita para o investimento.
E toda esta informação é analisada, auditada e aprovada ou não pelo auditor. Então, do ponto de vista de informação sobre qual é a estabilidade financeira da instituição, o relatório anual – provavelmente será publicado só no próximo ano – dará uma visão muito mais profunda e muito mais abrangente, que permite então às pessoas interessadas a nível nacional e internacional verem onde é que o capital do Fundo está investido e em que condições.
Com a adopção das normas IFRS, o investimento do Fundo pelos private equity em empresas exigirá destas relatórios e contas no mesmo modelo?
Dependendo da percentagem de investimento ou de capital que o Fundo investe na empresa, pode ser necessário que a empresa apresente informação financeira completamente. Por exemplo, se o Fundo tem 100% de uma empresa, essa tem de apresentar toda a informação auditada ou pelo menos uma avaliação independente do seu capital que possa ser adicionada no balanço do próprio Fundo.
Então, essa situação depende muito de quanto é que o fundo investe em cada empresa.Nas empresas fornecedoras de serviços ao Fundo é feita uma análise para se entender a sua viabilidade financeira para que não haja uma ruptura repentina na provisão desses serviços.
Como pensa melhorar os próximos exercícios financeiros face às recomendações da Deloitte & Touche Auditores?
A opinião do auditor até ao momento tem sido que a maneira como as contas são elaboradas tem sido correcta. É a opinião ao longo dos últimos três anos. Mas em todos os anos o auditor tem deixado alguma ênfase sobre certos aspectos que o conselho de administração devia observar e o trabalho contabilístico, em termos de operações internas futuras. Portanto, se reparar no relatório completo que foi publicado neste fim-de-semana no Jornal de Angola e que acredito está disponível com uma nota de imprensa, poderá ver que o auditor faz ênfase a três questões, então esta gestão às observações que o auditor faz ao conselho de administração serve de recomendação aos exercícios futuros.
A política de investimento do Fundo está em revisão, o que vai mudar de concreto?
A política de investimento do Fundo é um documento emitido pelo Executivo. No caso do Fundo, devido à alteração do quadro económico nacional, temos visto nos últimos dois anos que esta política não foi actualizada de forma a reflectir a situação actual do País, principalmente no que toca a transferência de capital adicional para a instituição.
Isso é algo que nós entendemos, portanto, as receitas do Estado em divisas e a previsibilidade do aumento destas receitas tem sido difícil. O auditor faz referência a esta questão e aconselha ao Fundo como fazer a implementação dos pressupostos todos de política de investimento neste quadro de incerteza que o País está a viver em termos de receitas fiscais.
Este cenário poderá alterar a quota de 7,5% do capital do Fundo destinado a projectos de desenvolvimento social?
Simplesmente, nós vamos seguir a fundo o que determina a política de investimento do Fundo, mas a revisão da política do fundo neste momento é um exercício difícil. Consideramos que dedicar 7,5% do capital do fundo a projectos sociais é muito importante.
Vários dos projectos que estão a se desenvolver pelo País requerem a integração das comunidades mais necessitadas, requerem programas de formação e condições sociais adequadas nas zonas onde este desenvolvimento está a ocorrer. Achamos que é importante manter estes 7,5% do capital do Fundo a projectos sociais, mas o conselho de administração seguirá o que estiver reflectido no diploma que o Executivo aprovar.
A política de investimento do Fundo actualmente já data de há alguns anos atrás e carece de revisão no âmbito do novo quadro económico nacional. Nós vamos aguardar pelas novas orientações e quando vierem vamos segui-las.
O resultado líquido do Fundo é negativo, e persiste a ideia de que a instituição só tem dado prejuízo ao Estado desde a sua constituição. O que está a acontecer de facto?
O resultado líquido negativo que o fundo está a mostrar é o valor que foi investido para o início e a manutenção das actividades diárias da instituição. Este valor tem estado a melhorar gradualmente.A nova previsão é que até 2017 o fundo comece a apresentar resultados positivos. Convém lembrarmo-nos de que o Fundo está a fazer investimentos a longo prazo, investimentos de elevado valor, e que vamos apresentar os resultados dentro de alguns anos.
Logo que estes resultados começarem a ser apresentados, o resultado líquido do Fundo vai melhorar substancialmente. Mas até lá temos de nos manter dedicados e continuar a trabalhar.Portanto, o fundo não é uma instituição criada para fazer lucros do dia para a noite, é, sim, uma instituição criada para fazer lucros durante vários anos. Estamos a trabalhar nesse sentido, não é uma actividade que é alcançada logo no primeiro dia, mas continuamos dedicados e confiantes de que, no máximo de dois anos, apresentaremos resultados positivos.
Entre investimentos do Fundo em infra-estrutura, hotelaria, mineração, agricultura e capital estruturado, quais prevêem lucros daqui a dois anos?
Na realidade, de forma individual, vários desses investimentos que mencionou já apresentam resultados positivos, mas o Fundo fez uma série de investimentos no passado que neste momento está a cobrir com as receitas que recebe destes projectos. Individualmente, vamos chegar a um ponto em que estas despesas para o arranque e manutenção do Fundo estarão cobertas, e vamos ver, simplesmente, os rendimentos positivos de projectos que mencionou.
Os investimentos nas grandes praças financeiras continuam como até há mais de um ano?
Em relação a um tempo atrás, o Fundo aumentou o montante que dedica a projectos que estão em Angola e nos países vizinhos e reduziu o montante que estava investido em mercados financeiros.
Mas é preciso notar que estes investimentos nos mercados financeiros feitos no estrangeiro garantem ao Fundo alguma liquidez, porque têm alguns deles retornos anuais, como é o caso das obrigações, onde o Fundo investe por exemplo 25% do seu capital.
Também nos investimentos em acções e outros tipos de títulos de participação, o Fundo tem 14% do seu capital investido, e obviamente que isso são investimentos mais líquidos que alguns dos quais apresentam retornos já com alguma frequência. A verdade é que estes investimentos estão fora do nosso continente e do nosso País, e uma componente importante do mandato do Fundo é desenvolver projectos que alavancam o desenvolvimento de Angola. Por este motivo é que 60% da carteira do Fundo está dedicada a projectos de private equity que permitem desenvolver as áreas de infra-estrutura, agricultura, silvicultura, etc.
Face aos investimentos em títulos nas grandes praças financeiras, para quando nos mercados regulamentados pela BODIVA?
Para nós, a evolução do mercado de capitais em Angola é muito boa para o progresso que o País está a fazer no ramo financeiro. Neste momento, a BODIVA trata principalmente de obrigações do Tesouro do Banco Nacional de Angola, mas nós vemos isso como um passo já muito positivo.
Porque traz muita transparência ao mercado, mais informação financeira e permite, a quem compra este tipo de instrumento, reflectir o valor real no seu balanço. Então, consideramos um avanço muito positivo para o mercado nacional.
Que resultados concretos se esperam do investimento para a concessão de larga escala de eucaliptos no Sul de Angola?
Os resultados nesta concessão de larga escala de eucaliptos são muito positivos, ascendem aos 50 milhões USD em termos de valor e têm permitido a muitas empresas, naquela região, trabalhar no âmbito deste projecto.
Nós esperamos muito mais ganhos no futuro em relação a este projecto. A área de produção de eucaliptos será reposta, serão plantados novos eucaliptos, haverá maior controlo do corte e haverá uma grande atenção ao impacto ambiental desta actividade, bem como ao impacto naquela comunidade em termos de geração de emprego e da maneira como as pessoas usam esta madeira. Então é um projecto que está a ser bem desenvolvido.
É claro que, no âmbito da carteira do investimento do Fundo, devido à sua dimensão, os resultados positivos que alcança ainda não estão visíveis, mas ao nível de um projecto individual é uma experiência que tem estado a correr bastante bem, e que nós achamos que tem tido um impacto bastante positivo na actividade da madeira naquela região. O Fundo de Infra-estrutura destinou até agora 19% de 1,1 mil milhões USD.
Tem previsão de investimentos em portos nacionais?
A gestão de portos em Angola tem a sua própria tutela, não está sob tutela do Fundo Soberano. Nós entendemos as preocupações que está a apresentar, mas o Fundo só pode investir num sector em que esteja sob tutela directa do Executivo caso tenha a concessão ou um mandato especial de outra natureza para investir nestes sectores, senão torna-se uma actividade ilegal.
Os investimentos na mineração estão na Mauritânia, o processo de levantamento geológico nacional abre horizontes?
Acredito que sim. Toda a nossa equipa partilha esta expectativa, por isso é que o capital continua comprometido a este sector e continuamos a analisar várias oportunidades de investimentos para se encontrar uma que realmente gere bons retornos.
Então, acreditamos no sector e continuamos atentos. Esperamos encontrar em breve, em Angola, um projecto que seja rentável.
Quais as regiões do País onde investem em fazendas agrícolas numa produção em grande escala?
As fazendas estão localizadas em várias regiões do País como Malanje, Uíge, Cunene, mas é preciso, em cada um dos casos, olhar-se para as infra-estruturas das mesmas e qual o tipo de produção que deve ser dedicada a cada uma delas para que se tornem rentáveis. O Fundo está muito interessado em que estes projectos possam permitir ao País concorrer com produtos que são importados e possam também ser exportados. Para isso, temos de ser capazes de produzir com custos bem controlados, então estão a ser considerados todos estes factores para que se possa iniciar essa actividade da melhor forma possível, para garantir que o capital público que é investido nestas fazendas tenha retorno.
Qual é a sua opinião sobre a tarefa do banco central na cooperação com BCE e Fed para reconquistar a credibilidade do sistema financeiro nacional?
Esta é uma questão para os reguladores. Nós, na posição de Fundo Soberano, consideramos que é uma necessidade, obviamente, isto facilita a todas instituições do País a transaccionarem livremente com um sistema financeiro internacional.
Mas devemos olhar também para os grandes avanços que já foram feitos a nível do sector bancário, mesmo do sector financeiro internacional. Hoje há em Angola bancos em quase todas as províncias, mas mesmo assim, em termos de bancarização, temos aproximadamente 20% da população abrangida. Então, muito mais deve ser feito para alcançar essas pessoas que precisam dos serviços bancários.
Para que este processo siga bem, é preciso haver alguma sensibilização para que as pessoas se adaptem às normas, que são muito rigorosas, o que é muito mais fácil para outros países mais desenvolvidos.
No sector não-bancário, vemos também muitas actividades, temos vários fundos de pensões, como o da ENSA que tem estado a progredir muito bem, temos outros fundos ligados ao sector público que têm um desempenho muito positivo, e temos também o Fundo Soberano, que tem estado a desenvolver-se bastante nos últimos anos. Todo o sector financeiro nacional, bancário e não-bancário, tem estado a desenvolver-se.
A necessidade em termos de conhecimento continua a ser elevada, mas devemos lembrar-nos de que o País só alcançou a paz há uma década e pouco. Então, muitos sectores ainda precisam de desenvolver-se, precisamos de formar muitos quadros, precisamos de capacitar a população para que saiba lidar com esse tipo de serviço e aceder ao mesmo.
Tudo isso leva tempo e precisa de empenho e investimento, e precisa que os angolanos confiem nas instituições públicas e a vários níveis se empenhem cada vez mais em fazer o seu trabalho, da forma mais correcta, elevar os objectivos e o crescimento que já foram alcançados pelo Estado.
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